Decisão de múltiplos casos
Regras de votação da Comissão Eleitoral Australiana
9 de Maio de 2024
O Comitê de Supervisão manteve as decisões da Meta de remover duas publicações separadas no Facebook contendo a mesma captura de tela de informações publicadas no site X pela Comissão Eleitoral Australiana, antes do Referendo da Voz Indígena da Austrália ao Parlamento.
2 casos incluídos neste pacote
FB-0TGD816L
Caso sobre coordenação de atos danosos e divulgação de crime no Facebook
FB-8ZQ78FZG
Caso sobre coordenação de atos danosos e divulgação de crime no Facebook
Resumo
O Comitê de Supervisão manteve as decisões da Meta de remover duas publicações separadas no Facebook contendo a mesma captura de tela de informações publicadas no site X pela Australian Electoral Commission (Comissão Eleitoral Australiana, AEC pelas siglas em inglês), antes do Referendo da Voz Indígena da Austrália ao Parlamento. Ambas as publicações não seguiram a regra do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, que proíbe conteúdo que incite participação ilegal em um processo de votação. Esses casos mostram como a informação fora do contexto pode impactar o direito ao voto das pessoas. O Comitê recomenda que a Meta explique mais claramente suas regras relacionadas com a fraude eleitoral e/ou de censo, fornecendo publicamente sua definição de “voto ilegal”.
Sobre os casos
Em 14 de outubro de 2023, a Austrália realizou seu Referendo da Voz Indígena ao Parlamento. Dias antes, um usuário do Facebook publicou em um grupo uma captura de tela de uma publicação da conta oficial da AEC no site X. As informações mostradas incluíam: “If someone votes at two different polling places within their electorate, and places their formal vote in the ballot box at each polling place, their vote is counted.” (Se alguém vota em dois locais de votação diferentes dentro de seu distrito eleitoral e deposita seu voto formal em cada um deles, seu voto é contabilizado.). Além disso, outro comentário retirado pelo usuário da mesma thread do site X explicou que o sigilo da votação impede a AEC de “knowing which ballot paper belongs to which person” (saber qual cédula para votação pertence a qual pessoa), ao mesmo tempo que afirma que “the number of double votes received is incredibly low” (o número de votos duplos recebidos é incrivelmente baixo). No entanto, a captura de tela não mostra todas as informações compartilhadas pela AEC, inclusive que votar várias vezes é crime. A legenda da publicação dizia: “vote early, vote often, and vote NO” (vote cedo, vote frequentemente e vote NÃO).
Uma segunda publicação compartilhada por outro usuário do Facebook continha a mesma captura de tela, mas tinha texto sobreposto com a declaração: “so you can vote Multiple times. They are setting us up for a ‘Rigging’ … smash the voting centres … it’s a NO, NO, NO, NO, NO.” (para que você possa votar várias vezes. Eles estão nos preparando para uma “Fraude”… destruam os centros de votação… é NÃO, NÃO, NÃO, NÃO, NÃO.)
O Referendo da Voz perguntou aos australianos se a Constituição deveria ser alterada para dar maior representação no parlamento aos povos aborígenes e das ilhas do Estreito de Torres.
A votação é obrigatória na Austrália, com a AEC reportando uma participação de cerca de 90% em todas as eleições e referendos desde 1924. O voto múltiplo é ilegal e uma forma de fraude eleitoral.
Depois que os sistemas automatizados da Meta detectaram ambas as publicações, analistas humanos as removeram por não seguirem a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas da Meta. Ambos os usuários fizeram uma apelação.
Principais conclusões
O Comitê conclui que ambas as publicações violaram a regra sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, que proíbe conteúdo “defendendo, fornecendo instruções ou demonstrando intenção explícita de participar ilegalmente em um processo de votação ou censo”. No primeiro caso, a frase “vote often,” (vote frequentemente,) em combinação com a informação da AEC sobre a contagem de votos múltiplos, é uma incitação clara ao envolvimento na votação ilegal. Votar duas vezes é um tipo de “voto ilegal”, de acordo com as diretrizes internas da Meta. No segundo caso, o uso da frase “smash the voting centres,” (destruam os centros de votação), juntamente com o resto da sobreposição de texto, pode ser entendida como uma defesa para que as pessoas tumultuem os locais de votação com votos múltiplos. Nenhuma das publicações se beneficia das exceções políticas sobre condenação, conscientização, reportagem de notícias ou contextos humorísticos ou satíricos. Especificamente, no que diz respeito à conscientização, as publicações não se enquadram nessa exceção, uma vez que vão além da discussão da publicação da AEC no site X e, em vez disso, descontextualizam a informação para insinuar que a AEC afirma que é permitido votar mais de uma vez.
Impedir que os usuários incitem outros a se envolverem em fraude eleitoral é um objetivo legítimo de proteção do direito ao voto. O Comitê considera o discurso político um componente vital dos processos democráticos. Nesses casos, ambos os usuários participaram diretamente no debate público desencadeado pelo referendo, mas suas incitações para que outros se envolvessem em comportamentos ilegais tiveram impacto nos direitos políticos das pessoas que vivem na Austrália, especialmente no direito ao voto. Assim, embora as incitações ao “vote No” (vote Não) sejam um discurso político protegido, as frases “vote often” (vote frequentemente) e “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) são uma questão diferente. O Comitê considera que a Meta estava correta em proteger os processos democráticos, evitando que tentativas de fraude eleitoral circulassem nas suas plataformas, considerando as frequentes alegações de que o Referendo da Voz foi fraudado.
O Comitê reconhece os esforços da Meta no Referendo da Voz. A empresa identificou proativamente conteúdo potencialmente violador de acordo com as regras de interferência na votação dos Padrões da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas e Desinformação. As frases “double vote” (voto duplo) e “vote multiple times” (votar várias vezes) foram as palavras-chave que ativaram o sistema de detecção baseado em palavras-chave da empresa nesse caso. Segundo a Meta, o sistema está adaptado aos contextos locais. Com base nas informações compartilhadas, o Comitê observa que iniciativas como essas devem ser aplicadas de forma consistente em todo o mundo, em países em período de eleições, embora a Meta seja incentivada a desenvolver métricas de sucesso para avaliar a eficácia da detecção baseada em palavras-chave.
Finalmente, o Comitê considera que as regras públicas do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas não são suficientemente claras. Elas não incluem o que está disponível aos analistas nas diretrizes internas da Meta, ou seja, as definições da empresa sobre “voto ilegal”. Dado que é crucial que os usuários possam interagir nas redes sociais para discutir questões de interesse público sobre eventos democráticos, a Meta precisa informar claramente os usuários sobre as regras.
Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão mantém as decisões da Meta de remover o conteúdo em ambos os casos.
Ele recomenda que a Meta:
- Incorpore sua definição do termo “voto ilegal” na linguagem voltada ao público da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas referente à proibição de conteúdo “defendendo, fornecendo instruções ou demonstrando intenção explícita de participar ilegalmente em um processo de votação ou censo, exceto se compartilhada em contextos de condenação, conscientização, reportagem de notícias ou contexto humorísticos ou satíricos”.
*Os resumos de casos fornecem uma visão geral dos casos e não têm valor de precedente.
Decisão completa sobre o caso
1. Resumo da decisão
O Comitê de Supervisão mantém as decisões da Meta de remover duas publicações separadas no Facebook contendo uma captura de tela de uma publicação da Comissão Eleitoral Australiana (AEC) no site X, anteriormente conhecido como Twitter. As capturas de tela da AEC publicadas pelos usuários do Facebook incluíam o seguinte: “If someone votes at two different polling places within their electorate, and places their formal vote in the ballot box at each polling place, their vote is counted.” (Se alguém vota em dois locais de votação diferentes dentro de seu distrito eleitoral e deposita seu voto formal em cada um deles, seu voto é contabilizado.). Na primeira publicação no Facebook, a captura de tela vinha acompanhada de uma legenda dizendo “vote early, vote often, and vote NO.” (vote cedo, vote frequentemente e vote NÃO). Na segunda publicação no Facebook, a captura de tela vinha acompanhada de uma sobreposição de texto, que incluía: “so you can vote Multiple times … they are setting us up for a ‘Rigging’ … smash the voting centres… it’s a NO, NO, NO, NO, NO.” (para que você possa votar várias vezes... eles estão nos preparando para uma ‘’Fraude”... destruam os centros de votação... é NÃO, NÃO, NÃO, NÃO , NÃO). A legenda também continha um emoji de “stop” (pare) seguido das palavras “Australian Electoral Commission” (Comissão Eleitoral Australiana).
O Comitê conclui que ambas as publicações não seguiram o Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, que proíbe conteúdo “defendendo, fornecendo instruções ou demonstrando intenção explícita de participar ilegalmente de um processo de votação ou censo, exceto se compartilhado em contexto de condenação, conscientização, reportagens de notícias ou contextos humorísticos ou satíricos.” O Comitê considera que nenhuma das exceções se aplica.
Esses casos levantam preocupações mais amplas em torno do compartilhamento de informação descontextualizada no cenário de processos democráticos, como eleições e referendos, com o potencial de impactar o direito de voto das pessoas. O Comitê recomenda que a Meta explique mais claramente as linhas políticas relacionadas à fraude eleitoral e/ou de censo no âmbito do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas para esclarecer o que constitui uma “participação ilegal em um processo de votação ou censo”.
2. Descrição do caso e histórico
Em 14 de outubro de 2023, a Austrália realizou seu Referendo da Voz Indígena ao Parlamento (doravante “Referendo da Voz”). Dias antes da votação, um usuário do Facebook de um grupo administrado por ele compartilhou uma publicação com uma captura de tela de uma publicação no site X feita pela conta oficial da Comissão Eleitoral Australiana (AEC). A publicação da AEC no site X incluiu o seguinte texto: “If someone votes at two different polling places within their electorate, and places their formal vote in the ballot box at each polling place, their vote is counted.” (Se alguém vota em dois locais de votação diferentes dentro de seu distrito eleitoral e deposita seu voto formal em cada um deles, seu voto é contabilizado.). A captura de tela também mostra outro comentário da mesma thread no site X, que explica que o sigilo do voto impede que a AEC “knowing which ballot paper belongs to which person” (saiba qual cédula pertence a qual pessoa) e tranquilizam as pessoas afirmando que “the number of double votes received is incredibly low” (o número de votos duplicados recebidos é incrivelmente baixo). No entanto, a captura de tela não mostra todas as informações compartilhadas pela AEC, inclusive que votar várias vezes é crime na Austrália. Uma legenda acompanhava a primeira publicação no Facebook, afirmando: “vote early, vote often, and vote NO” (vote cedo, vote frequentemente e vote NÃO).
Outra publicação contendo a mesma captura de tela da publicação da AEC no site X foi compartilhada um dia depois por outro usuário do Facebook em seu perfil. Ela continha uma sobreposição de texto, que incluía a seguinte afirmação: “so you can vote Multiple times. They are setting us up for a ‘Rigging’ … smash the voting centres … it’s a NO, NO, NO, NO, NO.” (para que você possa votar várias vezes. Eles estão nos preparando para uma “Fraude”… destruam os centros de votação… é NÃO, NÃO, NÃO, NÃO, NÃO.) A legenda também continha um emoji de “stop” (pare) seguido das palavras “Australian Electoral Commission” (Comissão Eleitoral Australiana).
Ambas as publicações foram detectadas proativamente pela Meta. As frases “double vote” (voto duplo) e “vote multiple times” (votar várias vezes) foram as palavras-chave que ativaram a “iniciativa de pipeline baseada em palavras-chave” da empresa nesse caso. Essa abordagem de detecção baseada em palavras-chave é um procedimento sistemático implantado pela Meta para identificar proativamente “conteúdo potencialmente violador, incluindo, mas não se limitando a, conteúdo relacionado à interferência de eleitores e censos”. Ambas as publicações foram automaticamente alinhadas para análise humana. Após esse processo, ambas as publicações foram removidas por não seguirem a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. A Meta também aplicou uma advertência padrão e um limite de recurso de 30 dias para ambos os perfis de usuário, o que impedia os usuários de publicar ou comentar em grupos do Facebook, criar grupos de notícias ou participar de salas do Messenger.
O Comitê observou o seguinte contexto para tomar suas decisões nesses casos:
O Referendo da Voz questionou se a Constituição da Austrália deveria ser alterada para reconhecer os Primeiros Povos da Austrália “por meio do estabelecimento de um órgão chamado Voz dos Aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres”, que teria sido capaz de “fazer representações ao Parlamento e ao Governo Executivo da Commonwealth sobre questões relacionadas aos povos aborígenes e das ilhas do Estreito de Torres”. Informações relevantes sobre o Referendo da Voz incluem o fato de que os povos Aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres na Austrália estão entre os grupos mais desfavorecidos social e economicamente no país, enfrentando altos níveis de desemprego, menor participação no ensino superior, condições ruins de saúde (física e mental), expectativa de vida muito menor do que outros australianos e elevados níveis de encarceramento. Os povos aborígenes e das ilhas do Estreito de Torres também enfrentam discriminação e são desproporcionalmente impactados por violência de gênero e policial.
O primeiro-ministro Anthony Albanese fez campanha a favor da emenda constitucional (apoiando o “Sim”), enquanto a principal coalizão de oposição da Austrália fez campanha contra ela (apoiando o “Não”). A proposta foi rejeitada nacionalmente e por maioria em todos os seis estados, não conseguindo assim garantir a dupla maioria necessária para alterar a Constituição australiana.
A votação é obrigatória na Austrália, e a AEC relata que a participação eleitoral foi de aproximadamente 90% em todas as eleições gerais e referendos desde 1924. O voto múltiplo é um tipo de fraude eleitoral tanto em nível estadual quanto federal, com base na Electoral Act 1918 (Lei Eleitoral de 1918) da Commonwealth e na Referendum (Machinery Provisions) Act 1984 (Lei de Referendo (Disposições de Equipamentos) de 1984). Em resposta às alegações de votação múltipla no Referendo da Voz, a AEC publicou uma longa thread no site X, que afirmava que a votação múltipla é “very rare” (muito rara) e delineou as medidas que a AEC tem em vigor para evitar a prática. A AEC explica em seu site que, para combater a votação dupla, listas certificadas idênticas de todos os eleitores de uma divisão são emitidas para cada local de votação. Quando os eleitores recebem um conjunto de cédulas para votação, seus nomes são marcados na lista certificada mantida naquele ponto de emissão. Se um eleitor se dirigir a outro ponto de emissão para emitir outro voto ordinário, outra cópia da lista certificada para essa divisão será marcada para indicar que a pessoa recebeu cédulas para votação. Imediatamente após o dia da votação, cada lista certificada idêntica para cada divisão é digitalizada para verificar se há ocorrências de marcas múltiplas em relação a quaisquer nomes. A AEC então investiga e escreve a cada eleitor suspeito de voto múltiplo. A resposta causa a resolução do problema por motivos como “erro do oficial de votação” ou explicações relacionadas a “dificuldades o idioma ou a alfabetização” ou com o fato de a pessoa ser “idosa e estar confusa e ter votado mais de uma vez por esquecer que já havia votado antes”. Quando não podem ser resolvidos, os casos restantes são investigados pela AEC e podem ser encaminhados à Polícia Federal Australiana para consideração.
Em 2019, a AEC testemunhou que a votação múltipla era um “problema muito pequeno”, em que apenas 0,03% dos 91,9% de participação foram marcações múltiplas e que a maioria dos casos de votação múltipla foram erros cometidos por eleitores idosos, com níveis baixos de alfabetização ou com baixa compreensão sobre o processo eleitoral. A AEC reiterou a taxa “insignificante” de ocorrência de votação múltipla na Austrália na sua apresentação de comentários públicos ao Comitê. De acordo com a AEC, apenas 13 casos de aparente votação múltipla de um total de 15,5 milhões de votos foram encaminhados à Polícia Federal Australiana para investigação adicional no contexto das eleições federais de 2022, (PC-25006; ver também PC-25007) .
Segundo especialistas consultados pelo Comitê, eram frequentes as alegações de que o Referendo da Voz foi fraudado, com algumas publicações acompanhadas das hashtags #StopTheSteal (#ParemDeRoubar) e #RiggedReferendum (#ReferendoFraudado). Reportagens jornalísticas também destacaram que as alegações de fraude eleitoral no contexto do Referendo da Voz eram comuns. Com base nas ferramentas de monitoramento das redes sociais implementadas por especialistas consultados pelo Comitê, até fevereiro de 2024, as capturas de tela das publicações da AEC no site X foram compartilhadas nas plataformas da Meta mais de 475 vezes, recebendo milhares de reações e pelo menos 30 mil visualizações.
3. Escopo e autoridade do Comitê de Supervisão
O Comitê tem autoridade para analisar a decisão da Meta após uma apelação do usuário cujo conteúdo foi removido (Seção 1 do Artigo 2 do Estatuto; e Artigo 3, Seção 1 dos Regulamentos Internos).
De acordo com o Artigo 3 da Seção 5 do Estatuto, o Comitê pode manter ou revogar a decisão da Meta, e a decisão é vinculante para a empresa, nos termos do Artigo 4 do Estatuto. A empresa também deve avaliar a viabilidade de aplicar sua decisão no que diz respeito a conteúdo idêntico em contexto paralelo, de acordo com o artigo 4 do Estatuto. As decisões do Comitê podem incluir sugestões não vinculantes às quais a Meta deve responder, de acordo com a Seção 4 do Artigo 3 e 4 do Estatuto. Quando a Meta se compromete a agir de acordo com as recomendações, o Comitê monitora sua implementação. Quando o Comitê identifica casos que levantam questões semelhantes, eles podem ser designados para um painel como um pacote para ser deliberado em conjunto. Uma decisão vinculante será tomada em relação a cada parte do conteúdo.
4. Fontes de autoridade e orientação
Os seguintes padrões e precedentes informaram a análise do Comitê nesses casos:
I. Decisões do Comitê de Supervisão
II. Políticas de Conteúdo da Meta
O fundamento da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas da Meta afirma que ela visa “prevenir e interromper danos no meio físico e comportamento com efeito copycat”, proibindo conteúdo que “facilite, organize, promova ou admita determinados crimes ou atividades prejudiciais direcionadas a pessoas, empresas, propriedades ou animais”. A política proíbe os usuários de publicar conteúdo que “defenda, forneça instruções ou demonstre intenção explícita de participar ilegalmente em um processo de votação ou censo, exceto se compartilhado para condenação, conscientização, reportagem jornalística ou em contextos humorísticos ou satíricos”.
Existem também tipos de conteúdo de interferência eleitoral ou de censo que podem ser removidos de acordo com a política, desde que haja contexto adicional para justificá-lo. Eles incluem “incitações para uma interferência coordenada que poderia afetar a capacidade de um indivíduo participar de uma eleição ou censo oficial”, bem como “ameaças de ir a um local de votação para monitorar ou observar as atividades dos eleitores ou dos funcionários eleitorais, se combinadas com uma referência a intimidação”.
A Política sobre Violência e Incitação da Meta visa prevenir “potenciais danos no meio físico” que possam estar relacionados ao conteúdo publicado nas plataformas da Meta. Ela proíbe “ameaças que possam levar à morte (e outras formas de violência de alta gravidade)”, bem como “ameaças de pegar em armas ou trazer armas para um local ou entrar à força em um lugar”, como “locais de votação ou usados para contabilizar votos ou administrar uma eleição”. Também proíbe ameaças de violência “relacionadas com a votação, o cadastro de eleitores ou a administração ou o resultado de uma eleição, mesmo que não haja um alvo”.
A Política sobre Desinformação da Meta articula como a empresa trata diferentes categorias de desinformação. Em uma dessas categorias, a Meta remove, “em um esforço para promover a integridade das eleições e dos censos”, “a desinformação que possa contribuir diretamente para um risco de interferência na capacidade das pessoas de participar nesses processos [políticos]”. Isso inclui “desinformação sobre quem pode votar, quais são os requisitos eleitorais, se um voto é contabilizado e quais informações ou materiais devem ser apresentados para votar”.
III. Responsabilidades da Meta com os direitos humanos
Os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos (UNGPs, na sigla em inglês), endossados pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2011, estabelecem uma estrutura voluntária de responsabilidades das empresas privadas em relação aos direitos humanos. Em 2021, a Meta anunciou sua Política Corporativa de Direitos Humanos, em que reafirmou seu compromisso em respeitar os direitos humanos de acordo com os UNGPs. Ao analisar as responsabilidades da Meta com os direitos humanos no caso em questão, o Comitê levou em consideração as seguintes normas internacionais:
- O direito à liberdade de expressão: Artigo 19 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, (PIDCP); Comentário Geral n.º 34, Comitê de Direitos Humanos 2011; Relatórios do Relator Especial da ONU sobre a liberdade de opinião e expressão: A/HRC/38/35 (2018) e A/74/486 (2019).
- Os direitos de votar e participar em assuntos públicos: Artigo 25 do PIDCP; Comentário geral 25, Comitê de Direitos Humanos, 1996.
5. Envios de usuários
Nas suas declarações ao Comitê, ambos os usuários alegaram que estavam apenas compartilhando informações publicadas pela AEC. O usuário que fez a segunda publicação afirmou ainda que ela serviu como um “warning to others” (aviso aos demais) de que a “election may be fraudulent” (eleição pode ser fraudulenta) por permitir o voto múltiplo, já que as pessoas “don’t need to show ID” (não precisam apresentar documento de identidade) para terem seus nomes marcados na lista.
6. Envios da Meta
A Meta determinou que ambas as publicações não seguiram a linha da política de “defender, fornecer instruções ou demonstrar intenção explícita de participar ilegalmente em um processo de votação ou censo” do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. Com base nas diretrizes internas da Meta para analistas de conteúdo, as políticas sobre interferência eleitoral da Meta se aplicam tanto às eleições quanto aos “referendos oficiais organizados por uma autoridade designada nacionalmente”. O termo “voto ilegal” inclui, “mas não está limitado a” o seguinte: “(a) votar duas vezes; (b) fabricar informações de votação para votar em um local onde você não é elegível; (c) fabricar sua elegibilidade para votar; e (d) roubo de cédulas para votação.”
Com relação à primeira publicação, a Meta enfatizou que a frase “vote often” (vote frequentemente) é “geralmente entendida como votar ilegalmente mais de uma vez em uma eleição”. A empresa também constatou que a frase não tinha a intenção de conter humor ou sátira, uma vez que o usuário pedia que as pessoas votassem “NÃO”, o que na opinião da Meta, constituía uma tentativa séria de promover a preferência política do usuário. A empresa também compartilhou com o Comitê que, ao analisar o conteúdo sobre eleições em grande escala, nem sempre é possível avaliar a intenção dos usuários que publicam possíveis sátiras.
Com relação à segunda publicação, a Meta considerou a frase “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) uma violação. A empresa explicou que a incitação do usuário “poderia ser lida como uma defesa para tumultuar a eleição com votação duplicada”, o que é proibido pela Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas por “defender ... a participação ilegal em um processo de votação ou censo”.
Segundo a Meta, se interpretada literalmente como uma incitação à destruição dos locais de votação, a frase violaria a Política sobre Violência e Incitação, uma vez que a política proíbe: (i) ameaças de violência de alta gravidade contra um local que possam levar a morte ou ferimentos graves de qualquer pessoa presente nesse local; e (ii) ameaças de violência “relacionadas à votação, ao cadastro de eleitores ou à administração ou ao resultado de uma eleição; mesmo que não haja alvo”. Com base nas orientações internas da Meta para analistas de conteúdo, as ameaças a locais devem ser declaradas em “termos explícitos”, como “explodir”, “incendiar”, “atirar” e também termos genéricos, como “ataque”, “emboscada” e “destruir” para que um conteúdo seja considerado uma violação dessa política.
A Meta publicou os esforços de integridade da empresa para o Referendo da Voz em uma publicação de blog em julho de 2023. Ela também afirmou ao Comitê que formou uma equipe multifuncional para iniciar os preparativos para o referendo em abril de 2023. A equipe consistia em equipes sediadas na Ásia-Pacífico, de acordo com a prática padrão para eleições nacionais. A Meta também formou um Centro de Operações de Produtos de Integridade (Integrity Product Operations Center, IPOC pelas siglas em inglês) virtual durante a última semana de campanha antes da votação para se concentrar no referendo durante um período de provável tensão elevada. O IPOC incluiu equipes de operações adicionais para responder rapidamente a escaladas e riscos críticos que surgiram antes do dia da votação. A Meta não aplicou o Protocolo de Política de Crise ou quaisquer outras alavancas políticas para o Referendo da Voz.
Ela também explicou a “iniciativa de pipeline baseada em palavras-chave” da empresa, que identifica e alinha automaticamente conteúdo potencialmente violador contendo palavras-chave, seja em texto ou imagens como capturas de tela, para análise humana por meio de “um pipeline digital especializado que procura palavras-chave específicas”. A Meta disse ao Comitê que a lista inclui muitas palavras e frases desenvolvidas pelas equipes regionais e de desinformação da Meta. A principal função desse sistema de detecção baseado em palavras-chave é “garantir a integridade” das eleições e referendos, “identificando sistematicamente e analisando manualmente o conteúdo relevante”. O sistema de detecção baseado em palavras-chave foi ativado, nesse caso, por causa do IPOC virtual que foi configurado para o Referendo da Voz. A Meta implementa a iniciativa globalmente. Isso não se limita a países ou regiões específicas, mas é adaptado aos contextos locais. Segundo a Meta, a lista de palavras-chave é “dinâmica”, sujeita a alterações e “específica à natureza de cada evento”.
A iniciativa procura aplicar ativamente as seguintes áreas dos Padrões da Comunidade da Meta: (i) a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas que aborda “fraude eleitoral e/ou de censo, incluindo ofertas de compra ou venda de votos com presentes em dinheiro e declarações que defendem ou instruem participação em processos de votação ou censo;” e (ii) a Política sobre Desinformação centrada na interferência dos eleitores ou no censo, incluindo “desinformação sobre datas de votação ou censo, locais, horários, métodos, qualificações dos eleitores, contagem de votos e materiais de votação necessários”. O sistema de detecção baseado em palavras-chave para o Referendo da Voz não foi projetado para aplicar ativamente outras políticas de conteúdo relativas a eleições ou votação, como aquelas conforme o Padrão da Comunidade sobre Violência e Incitação. No entanto, se o conteúdo sinalizado pela iniciativa não seguir outros Padrões da Comunidade, ele também estará sujeito ao monitoramento mediante análise humana.
Com relação ao conteúdo desse caso, as frases “voto duplo” e “votar várias vezes” foram as palavras-chave que ativaram o sistema de detecção da Meta. O termo “double vote” (voto duplo) não foi usado diretamente nas publicações do Facebook, mas apareceu na captura de tela da publicação da AEC no site X. Qualquer conteúdo que contenha essas palavras-chave, seja como texto ou em imagens como capturas de tela, é “sinalizado automaticamente e alinhado para análise humana a fim de monitorar proativamente o discurso relacionado à supressão de eleitores”.
O Comitê fez 12 perguntas à Meta por escrito. As perguntas estavam relacionadas às políticas de conteúdo de interferência na votação da Meta, ao sistema de detecção baseado em palavras-chave e aos protocolos que a Meta adotou para moderar o conteúdo relacionado ao Referendo da Voz. Todas foram respondidas.
7. Comentários públicos
O Comitê de Supervisão recebeu cinco comentários públicos que cumpriam os termos para envio. Três foram enviados da região Ásia-Pacífico e Oceania (todos da Austrália), um dos Estados Unidos e do Canadá e um da Europa. Para ler os comentários públicos enviados com consentimento de publicação, clique aqui.
Os envios cobriram os seguintes temas: o contexto sócio-histórico que levou ao Referendo da Voz, a história da fraude eleitoral na Austrália, a disseminação de informações enganosas e descontextualizadas durante o Referendo da Voz e as políticas de conteúdo e práticas de monitoramento da Meta sobre desinformação em geral.
8. Análise do Comitê de Supervisão
O Comitê examinou se essas publicações deveriam ser removidas analisando as políticas de conteúdo, as responsabilidades e os valores dos direitos humanos da Meta. Também avaliou as implicações desse caso quanto à abordagem mais ampla da Meta em relação à governança de conteúdo.
O Comitê selecionou esses casos para examinar as políticas de moderação de conteúdo e práticas de monitoramento da Meta sobre informações eleitorais enganosas ou descontextualizadas e fraude eleitoral, dado o número histórico de eleições em 2024. Os casos se enquadram na prioridade estratégica do Comitê: Eleições e Espaço Cívico.
8.1 Conformidade com as Políticas de Conteúdo da Meta
I. Regras sobre conteúdo
O Comitê conclui que ambas as publicações não seguiram a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, que proíbe a defesa da participação ilegal em um processo de votação ou censo. A frase “vote often” (vote frequentemente) na primeira publicação, quando compartilhada juntamente com a publicação da AEC no site X sobre a contagem de votos múltiplos, é uma clara incitação ao envolvimento nessa prática. De acordo com as diretrizes internas da Meta para analistas de conteúdo, “votar duas vezes” é uma forma de “voto ilegal”.
A segunda publicação também não segue a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. Ela continha uma captura de tela da publicação no site X e vinha acompanhada de uma sobreposição de texto dizendo “so you can vote multiple times” (para que você possa votar várias vezes). Também incita as pessoas a “smash the voting centres” (destruam os centros de votação). O usuário pode estar simplesmente tentando expressar sua frustração com a AEC por supostamente permitir que as pessoas “vote multiple times” (votem várias vezes). A frase, no entanto, quando lida em conjunto com o resto do texto sobreposto na captura de tela, alegando que a AEC estava tolerando a votação múltipla e acusando-a de preparar as pessoas para uma “rigging” (fraude), pode ser mais razoavelmente entendida como uma defesa para que as pessoas tumultuassem o local de votação com votos múltiplos. No contexto das eleições australianas, onde o voto é obrigatório e a participação é superior a 90%, uma incitação às pessoas para que votem uma vez é uma interpretação improvável de “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) especialmente quando essa incitação é seguida de uma alegação de que as pessoas “can vote multiple times” (podem votar várias vezes). Isso é ainda apoiado pelo pedido do usuário para que as pessoas votem repetidamente “No” (“NO, NO, NO, NO, NO”) (Não, NÃO, NÃO, NÃO, NÃO, NÃO). Quando lido como um todo e no contexto das eleições australianas, a publicação constitui assim uma incitação ao voto duplo, o que equivale a “voto ilegal”, proibido pela Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas.
O Comitê reconhece que, embora seja possível que as publicações tenham sido feitas de forma satírica, essa intenção não é explícita. Ele não acredita que as publicações fossem implicitamente satíricas com base na linguagem das legendas e na sobreposição de texto nas imagens. Embora o grau de certeza na chamada para ação seja diferente para ambas as publicações, cada uma delas inclui um apelo ao envolvimento em votação múltipla, portanto, “ilegal”. Dados os riscos associados às tentativas de fraude eleitoral em contextos eleitorais, o Comitê acredita que a exceção para humor ou sátira da Meta só deve se aplicar, nessas circunstâncias, a conteúdos que sejam explicitamente humorísticos. Portanto, nenhuma das publicações se qualifica para essa exceção.
As publicações também não se qualificam para a exceção sobre conscientização ao abrigo da Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas. As capturas de tela e grande parte do conteúdo criado pelos usuários foram elaborados para chamar a atenção para a possibilidade de fraude eleitoral com base na declaração da AEC. No entanto, eles foram além e encorajaram ativamente outros a participarem ilegalmente no Referendo da Voz por meio de votação múltipla, em vez de apenas discutirem as publicações da AEC no site X. As publicações não continham contexto adicional fornecido pela AEC, na mesma thread no site X, afirmando que votar várias vezes é um crime na Austrália. Portanto, em vez de aumentar a conscientização sobre a possibilidade de voto múltiplo, ambas as publicações descontextualizaram o que a AEC escreveu para sugerir que ela está afirmando que é permitido votar mais de uma vez.
Ao contrário da Meta, o Comitê não acredita que uma interpretação mais literal da palavra “smash” (destruir) (que significa a destruição de locais) seja aplicável nesse caso, dada a falta de sinais que apontem nessa direção (por exemplo, contexto de conflito ou tensões elevadas com circulação generalizada de conteúdos que incitam diretamente à violência). Portanto, o Comitê conclui que a segunda publicação segue a Política sobre Violência e Incitação da Meta.
O Comitê também avaliou ambos os itens de conteúdo em relação à Política sobre Desinformação da Meta, visto que descontextualizam o que a AEC escreveu. O Comitê concluiu, no entanto, que o Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas é a política aplicável nesse caso porque ambos os usuários estão encorajando outros a envolverem-se em fraude eleitoral.
II. Medida de aplicação
O Comitê reconhece os esforços de integridade da Meta para o Referendo da Voz, incluindo o sistema de detecção baseado em palavras-chave adotado pela Meta. A empresa explicou que o sistema foi implantado para identificar proativamente conteúdo potencialmente violador de acordo com as linhas da política sobre interferência na votação dos Padrões da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas e Desinformação. Segundo a Meta, o sistema de detecção baseado em palavras-chave é adaptado aos contextos locais e contém termos específicos do mercado. Com base nas informações que a Meta compartilhou com o Comitê sobre como a iniciativa funciona, ele reconhece que o sistema de detecção baseado em palavras-chave foi implantado e parece ter funcionado nesse caso. Iniciativas como essa precisam de ser aplicadas de forma consistente em todo o mundo, em todos os países submetidos a eleições e outros processos democráticos. O Comitê também acredita que essa iniciativa deve abranger a interferência na votação e políticas relacionadas no âmbito do Padrão da Comunidade sobre Violência e Incitação.
Dadas as limitações das abordagens baseadas em palavras-chave para a detecção de conteúdos prejudiciais, o Comitê continuará a avaliar a eficácia do sistema da Meta em outros casos relacionados com eleições. A esse respeito, o Comitê incentiva a Meta a desenvolver métricas de sucesso para avaliar a eficácia do sistema de detecção baseado em palavras-chave, juntamente com outros esforços de integridade nas eleições, na identificação de conteúdo potencialmente violador conforme políticas relevantes para as eleições. Isso estaria de acordo com a recomendação do Comitê na decisão do caso Discurso de general brasileiro para que a Meta “desenvolvesse uma estrutura para avaliar os esforços de integridade eleitoral da empresa”.
8.2 Conformidade com as responsabilidades da Meta relativas aos direitos humanos
Liberdade de expressão (Artigo 19 PIDCP)
O Artigo 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP) prevê ampla proteção para expressões de “todos os tipos”. Esse direito inclui a “liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza”. O Comitê dos Direitos Humanos da ONU enfatizou que o valor da expressão é particularmente elevado quando se discute questões políticas, candidatos e representantes eleitos (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 13). Isso inclui expressões “profundamente ofensivas”, críticas às instituições públicas e às opiniões que podem ser errôneas (Comentário Geral n.º 34, parágrafos 11, 38 e 49).
O Comitê dos Direitos Humanos da ONU enfatizou que a liberdade de expressão é essencial para a condução dos assuntos públicos e para o exercício efetivo do direito ao voto (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 20). O Comitê afirma ainda que a livre comunicação de informações e ideias sobre questões públicas e políticas entre os cidadãos é essencial para o gozo do direito de participar na condução dos assuntos públicos e do direito ao voto, Artigo 25 do PIDCP (Comentário Geral n.º 25, parágrafo 25). Nesse caso, ambos os usuários participaram no referendo, uma questão de interesse público, para compartilharem suas opiniões sobre qual deveria ser o resultado, participando assim diretamente no debate público desencadeado pelo processo de referendo.
Quando um Estado aplica restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade, segundo o parágrafo 3 do Artigo 19 do PIDCP. Esses requisitos costumam ser chamados de “teste tripartite”. O Comitê usa essa estrutura para interpretar os compromissos voluntários de direitos humanos da Meta, tanto em relação à decisão de conteúdo individual sob análise quanto ao que isso diz sobre a abordagem mais ampla da empresa à governança de conteúdo. Como em casos anteriores (por exemplo, Armênios no Azerbaijão, Vídeo de prisioneiros de guerra armênios), o Comitê concorda com o Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão que embora “as empresas não tenham obrigações governamentais, seu impacto é do tipo que exige que avaliem o mesmo tipo de questões sobre a proteção do direito de seus usuários à liberdade de expressão,” ( A/74/486, parágrafo 41). Ao fazer isso, o Comitê tenta ser sensível às formas pelas quais as responsabilidades de direitos humanos de uma empresa privada de rede social podem diferir das de um governo que implementa suas obrigações de direitos humanos.
I. Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)
As regras que restringem a expressão devem ser claramente definidas e comunicadas, tanto para aqueles que aplicam as regras como para aqueles que são impactados por elas (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 25). Os usuários devem ser capazes de prever as consequências da publicação de conteúdo no Facebook e no Instagram. O Relator Especial da ONU sobre liberdade de expressão destacou a necessidade de "clareza e especificidade" nas políticas de moderação de conteúdo ( A/HRC/38/35, parágrafo 46).
A linguagem voltada ao público do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas não é suficientemente clara para o usuário. Considerando a importância de os usuários poderem participar nas redes sociais para discutir questões de interesse público no contexto de eventos democráticos, a Meta precisa de garantir que eles são claramente informados sobre as regras aplicáveis. Isso ajudará os usuários a prever se o conteúdo que estão publicando é potencialmente violador. A esse respeito, o Comitê considera que o esclarecimento nas diretrizes internas sobre o que constitui “voto ilegal” deve ser incorporado no Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, voltada ao público.
II. Objetivo legítimo
As restrições à liberdade de expressão devem ter um objetivo legítimo (artigo 19, parágrafo 3 do PIDCP), incluindo a proteção da “ordem pública” e dos “direitos de outras pessoas”.
A Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas visa “prevenir e interromper danos no meio físico e comportamento com efeito copycat”, removendo conteúdo “que facilita, organiza, promove ou admite determinadas atividades criminosas ou prejudiciais”.
Proteger o direito de voto e de participar na condução dos assuntos públicos é um objetivo que a Política sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas pode legitimamente buscar, especialmente no contexto de eleições (Artigo 25, PIDCP). O Comitê considera que impedir que os usuários incitem outras pessoas a se envolverem em fraude eleitoral é um objetivo legítimo para proteger o direito ao voto. O Comentário Geral n.º 25 sobre o direito de voto estabelece que “deve haver um escrutínio independente do processo de votação e contagem” para que “os eleitores tenham confiança na segurança da votação e na contagem dos votos” (parágrafo 20). Além disso, existe “o princípio de que uma pessoa, um voto deve ser aplicado”, o que significa que “o voto de um eleitor deve ser igual ao voto de outro” (parágrafo 21). O Comitê também observa que a política ajuda a preservar a “ordem pública”, protegendo os locais de votação e os processos democráticos da interferência dos eleitores, de forma mais ampla.
III. Necessidade e proporcionalidade
Nos termos do Artigo 19 do PIDCP, parágrafo 3, a necessidade e a proporcionalidade exigem que as restrições à expressão “devem ser apropriadas para cumprir sua função protetora; elas devem ser proporcionais ao interesse a ser protegido” (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 34). Como parte de suas responsabilidades com os direitos humanos, as empresas de redes sociais devem considerar uma série de possíveis respostas a conteúdo problemático além da sua exclusão, para garantir que as restrições sejam ajustadas de forma restrita (A/74/486, parágrafo 51).
O Comitê considera que a remoção de ambas as publicações do Facebook pela Meta atendeu aos requisitos de necessidade e proporcionalidade. O Comitê observa que o conteúdo foi publicado dias antes de um próximo referendo que marcou um momento constitucional significativo na Austrália, especialmente para os povos aborígenes e das ilhas do Estreito de Torres. Por um lado, o discurso político é uma componente vital dos processos democráticos, e ambos os usuários participaram diretamente no debate público desencadeado pelo referendo. Por outro lado, as incitações dos usuários para que outras pessoas se envolvessem em comportamentos ilegais no contexto do referendo impactaram os direitos políticos das pessoas que vivem na Austrália, particularmente o direito de votar e de participar na condução de assuntos públicos.
Aplicando esses padrões ao conteúdo do caso, as incitações a “vote No” (votar Não) em ambas as publicações são discurso político claramente protegido. No entanto, a frase “vote often” (vote frequentemente) na primeira publicação e a frase “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) na segunda publicação são uma questão diferente, dado o fato de encorajarem ativamente outros a participarem ilegalmente no Referendo da Voz por meio de votação múltipla, como explicado com mais detalhes na Seção 8.1 acima. Especialistas consultados pelo Comitê observaram que as alegações de fraude eleitoral eram frequentes, enquanto as reportagens jornalísticas destacavam que elas eram comuns. Portanto, o Comitê considera que a Meta estava correta ao proteger os processos democráticos, evitando que tentativas de fraude eleitoral circulassem nas plataformas dela (Comentário Geral n.º 25). A circulação de conteúdos relacionados com a fraude eleitoral pode criar um ambiente em que a integridade dos processos eleitorais é colocada em risco. No entanto, uma minoria do Comitê considera que a remoção da publicação que incita as pessoas a “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) não passa no teste de necessidade e proporcionalidade, dada a falha da Meta em estabelecer uma “ligação direta e imediata entre a expressão e a ameaça,” (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 35). Para essa minoria, considerando o fato de a incitação do usuário para que as pessoas “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) ser uma incitação ambígua para que elas votem múltiplas vezes, a ligação com a ameaça de fraude eleitoral não foi direta e imediata.
O Comitê acredita que a abordagem da Meta de esperar clareza dos usuários ao aplicar exceções é sensata para avaliar se o conteúdo foi compartilhado em contexto de condenação, conscientização, reportagem de notícias ou contexto humorístico ou satírico. Não houve nenhuma indicação clara nas publicações em análise pelo Comitê de que as frases “vote often” (vote frequentemente) e “smash the voting centres” (destruam os centros de votação) foram feitas de forma retórica, em vez de defenderem claramente o voto múltiplo, uma ação que colocou a integridade do Referendo da Voz em risco. Portanto, ambas as remoções foram respostas necessárias e proporcionais da Meta.
Além disso, uma minoria do Comitê não está convencida de que a remoção de conteúdo seja o meio menos intrusivo disponível para a Meta abordar discursos relacionados com a fraude eleitoral, e considera que a falha da empresa em demonstrar o contrário não satisfaz o requisito de necessidade e proporcionalidade. O Relator Especial declarou: “assim como os Estados devem avaliar se uma limitação de discurso é a abordagem menos restritiva, as empresas também devem realizar esse tipo de avaliação. E, ao realizar a avaliação, as empresas devem arcar com o ônus de demonstrar publicamente a necessidade e proporcionalidade” ( A/74/486, parágrafo 51). Para essa minoria, a Meta deveria ter demonstrado publicamente porque a remoção dessas publicações é o meio menos intrusivo das muitas ferramentas que tem à sua disposição para evitar prováveis danos a curto prazo, como a fraude eleitoral. Se não puder fornecer essa justificação, a Meta deverá, então, ser transparente ao reconhecer que as suas regras de expressão divergem dos padrões de direitos humanos da ONU e fornecer uma justificação pública para fazer isso. A minoria acredita que o Comitê estaria então decidido a considerar a justificativa pública da Meta e que haveria um diálogo público sem gerar o risco de distorção dos padrões existentes de direitos humanos da ONU.
9. Decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão mantém as decisões da Meta de remover ambos os itens de conteúdo.
10. Recomendações
Política de Conteúdo
1. Para garantir que os usuários estejam totalmente informados sobre os tipos de conteúdo proibidos de acordo com a seção “Fraude eleitoral e/ou de censo” do Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, a Meta deve incorporar sua definição do termo “voto ilegal” na linguagem voltada ao público da política, que proíbe conteúdo: “defendendo, fornecendo instruções ou demonstrando intenção explícita de participar ilegalmente em um processo de votação ou censo, exceto se compartilhada em contextos de condenação, conscientização, reportagem de notícias ou contexto humorísticos ou satíricos”.
O Comitê considerará essa recomendação implementada quando a Meta atualizar seu Padrão da Comunidade sobre Coordenação de Atos Danosos e Incentivo à Prática de Atividades Criminosas, voltado ao público, para refletir a mudança.
*Nota processual:
As decisões do Comitê de Supervisão são preparadas por grupos com cinco membros e aprovadas pela maioria do Comitê. As decisões dele não representam, necessariamente, as opiniões pessoais de todos os membros.
Para a decisão sobre esse caso, uma pesquisa independente foi solicitada em nome do Comitê. O Comitê recebeu assistência da Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, confiança e segurança, e tecnologia. A Memetica, uma organização dedicada à pesquisa de código aberto sobre tendências de redes sociais, também forneceu análises.
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