Decisão de múltiplos casos
Imagens de mulheres indígenas parcialmente nuas
3 de Junho de 2025
O Comitê de Supervisão anulou a decisão da Meta em três dos quatro casos que demonstram os impactos desproporcionais da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos em determinados usuários, enquanto manteve a decisão de deixar ativo o conteúdo em um terceiro caso.
4 casos incluídos neste pacote
IG-K2VKGH0Z
Caso sobre nudez ou atividade sexual de adultos no Instagram
IG-V2CNBBWA
Caso sobre nudez ou atividade sexual de adultos no Instagram
IG-E7ESESOY
Caso sobre nudez ou atividade sexual de adultos no Instagram
FB-OIPQ123W
Caso sobre nudez ou atividade sexual de adultos no Facebook
Para ler a decisão completa em alemão, clique aqui.
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Resumo
O Comitê de Supervisão anulou a decisão da Meta em três dos quatro casos que demonstram os impactos desproporcionais da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos em usuários que compartilham imagens de mulheres indígenas com os seios descobertos, quando essa nudez faz parte das crenças e dos costumes dos povos indígenas. Também manteve a decisão de deixar ativo o conteúdo em um terceiro caso devido à permissão para conteúdo de valor jornalístico.
A proibição total da Meta de postar imagens de mulheres indígenas com os seios descobertos em contextos não sexuais, juntamente com a concessão de exceções ad hoc, não resulta em restrições necessárias e proporcionais à expressão. Em vez disso, o direito dos usuários à expressão, incluindo o dos povos indígenas que tem essa nudez como parte de sua cultura, é desproporcionalmente restringido.
A Meta deve tornar pública sua exceção da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, permitindo conteúdo que retrate mulheres indígenas com os seios descobertos em algumas circunstâncias, quando essa nudez reflete costumes e crenças socialmente aceitos e não deturpa essas práticas.
Sobre os casos
O Comitê analisou quatro casos com imagens mostrando mulheres indígenas com os seios descobertos em contextos não sexuais.
No primeiro caso, um usuário do Instagram postou uma imagem em julho de 2024 mostrando duas mulheres com seios descobertos em trajes tradicionais do povo himba, da Namíbia. O post inclui uma citação em inglês e uma legenda fazendo referência aos himbas. O usuário parece ser um visitante ou turista, e não um membro dessa etnia. Um classificador automatizado de nudez e pornografia o removeu. O usuário fez uma apelação da remoção. Após uma análise humana, a Meta confirmou sua decisão.
O segundo caso envolve um usuário do Instagram que postou um vídeo curto em julho de 2024 mostrando um homem himba dançando, com mulheres com seios descobertos em trajes tradicionais desse povo ao fundo. A legenda inclui referências ao povo e à cultura himba. Após análises automatizadas e humanas, a Meta removeu o conteúdo.
No terceiro caso, a conta oficial do Instagram de um partido político brasileiro postou em março de 2023 uma imagem de mulheres indígenas com seios descobertos em trajes tradicionais ianomâmis. O texto que acompanha elogia os esforços do governo para combater a mineração ilegal em terras ianomâmis. Um usuário denunciou o post, e um classificador o identificou antes que um analista humano o removesse por não seguir a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos. O usuário que postou fez uma apelação por meio de um contato pessoal na Meta. A empresa restaurou-o conforme a permissão para conteúdo de valor jornalístico, constatando que o valor de interesse público do conteúdo superava o dano, e aplicou um rótulo de conteúdo de valor jornalístico. Em setembro de 2024, a Meta encaminhou o caso ao Comitê.
No quarto caso, o administrador da página do Facebook de um jornal alemão postou uma imagem em maio de 2023 de uma mulher indígena com os seios descobertos segurando uma criança. A legenda e a sobreposição de texto em alemão descrevem a visita de uma jornalista americana a uma aldeia maia e suas perspectivas sobre as abordagens parentais de diferentes culturas, e o post contém um link para um artigo. A imagem da mulher indígena parece pertencer a uma agência de fotos e aparece em coleções online sobre o povo karo, da Etiópia. Um usuário denunciou o conteúdo à Meta e dois analistas humanos concordaram que ele não seguia a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos. Como essa conta está no programa de verificação cruzada, o post foi enviado para análise adicional. A Meta então determinou que o conteúdo deveria receber uma permissão da política e permanecer no Facebook, pois, embora não seguisse as regras sobre nudez da Meta, mantê-lo estava de acordo com o fundamento da política. Ela encaminhou o caso ao Comitê em setembro de 2024.
Principais descobertas
Embora a Meta proíba imagens de mulheres indígenas com “mamilos visíveis” em contextos não sexuais, às vezes ela permite esse conteúdo com base na política e em permissões para conteúdo de valor jornalístico.
No post sobre os ianomâmis, a Meta estava certa em manter esse post como conteúdo de valor jornalístico devido ao seu valor de interesse público e ao risco limitado de danos. Os ianomâmis têm uma prática social e cultural de nudez com os seios e peito descobertos, e há indicadores de consentimento na imagem.
Em relação aos dois posts sobre os himbas, o Comitê considera que a Meta errou ao não aplicar a permissão da política. A empresa não seguiu suas próprias diretrizes sobre exceção relativas ao consentimento implícito no contexto da nudez indígena, que se concentram na possibilidade de a nudez com os seios descobertos fazer parte das crenças e dos costumes de um povo indígena e ser socialmente aceita. A nudez é um aspecto social e historicamente aceito do povo himba, e ambos os posts mostram indícios suficientes de consentimento implícito para fotos e gravação a fim de justificar a permissão.
No post sobre os povos maia/karo, a maioria do Comitê considera que o fato de a imagem ter sido compartilhada por um meio de comunicação não é um fator decisivo para estabelecer o consentimento. Neste caso, há uma clara disparidade entre o assunto do artigo (povos maias) e o indivíduo na imagem (uma mulher karo). O conteúdo, focado nas práticas parentais nas culturas maias, não se relaciona com uma tradição social ou histórica de nudez. Portanto, permitir que o conteúdo permaneça na plataforma é inconsistente com o fundamento da política da Meta. Uma minoria do Comitê discorda, concluindo que a Meta tomou a decisão certa ao manter o post, já que a nudez na imagem está alinhada às normas culturais do grupo indígena retratado. Para a minoria, a disparidade entre as imagens foi um erro menor que não diminui o interesse do público no post.
Remover os posts sobre o povo himba e manter o post sobre os povos maia/karo também foi inconsistente com as responsabilidades de direitos humanos da Meta. A proibição total da Meta de postar imagens de mulheres indígenas com os seios descobertos em contextos não sexuais e a concessão de exceções ad hoc restringem desproporcionalmente a expressão. Ela afeta desproporcionalmente o direito das mulheres indígenas à autoexpressão e ao compartilhamento de informações sobre práticas culturais, além de restringir o acesso de outras pessoas a essas informações. O Comitê ressalta a importância de representar as culturas indígenas de maneiras que evitem distorção ou descontextualização.
O Comitê está preocupado com a possibilidade de a política e as permissões para conteúdo de valor jornalístico terem limitações significativas de acessibilidade e previsibilidade. Portanto, ele acredita que uma exceção claramente definida é preferível.
O Comitê considera que a Meta poderia desenvolver diretrizes internas para auxiliar analistas em escala a escalar conteúdo de nudez indígena que poderia potencialmente se beneficiar dessas exceções, usando critérios objetivos, como hashtags relevantes ou indicações visuais, incluindo símbolos culturais.
A decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê anula a decisão da Meta de remover os posts das duas mulheres himbas e do povo himba dançando. Ele também anula a decisão da empresa de deixar ativo o post sobre os povos maia/karo. O Comitê mantém a decisão da Meta de deixar ativo o post sobre os ianomâmis.
Ele também recomenda que a Meta faça o seguinte:
- Torne pública sua exceção da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, permitindo conteúdo que retrate mulheres indígenas com os seios descobertos em algumas circunstâncias. Essa exceção deve ser aplicada somente em escalation. A exceção deve permitir essa nudez quando ela refletir costumes e crenças socialmente aceitos e não deturpar essas práticas.
*Os resumos de casos fornecem uma visão geral dos casos e não têm valor de precedente.
Decisão completa sobre o caso
1. Descrição do caso e histórico
Essa decisão aborda quatro casos com imagens mostrando mulheres indígenas com os seios descobertos. A Meta determinou que todos os quatro itens de conteúdo não seguiam sua Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, que proíbe “mamilos femininos visíveis”. Ela encaminhou dois casos ao Comitê de Supervisão, referentes ao conteúdo que manteve na plataforma apesar de não seguir suas regras. Os usuários fizeram apelações nos outros dois casos quando seus posts foram removidos.
No primeiro caso, um usuário do Instagram postou uma imagem em sua conta em julho de 2024 mostrando duas mulheres com os seios descobertos, vestidas com trajes tradicionais do povo himba, da Namíbia. A imagem inclui uma citação em inglês e uma legenda fazendo referência aos himbas, a Opuwo (a capital da província de Kunene, onde os himbas vivem) e à Namíbia. Com base no perfil do usuário, na imagem e na legenda, o usuário não parece ser himba, mas um visitante ou turista. Uma das ferramentas automatizadas da Meta, um classificador de nudez e pornografia, removeu o post por não seguir a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos da Meta. O usuário fez uma apelação da remoção. Após uma análise humana, a Meta confirmou sua decisão.
No segundo caso, um usuário postou um vídeo curto em sua conta do Instagram em julho de 2024, mostrando um homem himba dançando com o peito descoberto, com mulheres com os seios descobertos em trajes tradicionais himbas ao fundo. A legenda contém referências em inglês, francês e árabe ao povo himba, bem como à dança e à cultura africanas, e a viagens. O texto em árabe na imagem também faz referência à cultura himba. Um classificador de nudez e pornografia identificou o conteúdo como uma potencial violação da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos da Meta e o enviou para análise humana. No entanto, o post não foi priorizado para análise. Depois que o mesmo classificador identificou novamente o conteúdo porque o número de visualizações ou interações aumentou, ele foi removido por um analista humano. O usuário fez uma apelação da decisão da Meta e, após outra análise humana, a empresa confirmou a remoção.
No terceiro caso, a conta oficial do Instagram de um partido político brasileiro postou em março de 2023 uma imagem de mulheres indígenas com seios descobertos em trajes tradicionais ianomâmis. O texto em português na imagem elogia os esforços do governo para combater a mineração ilegal em terras ianomâmis. A legenda em português enfatiza a importância de um governo que proteja os direitos territoriais dos indígenas. O post foi denunciado por outro usuário, mas permaneceu na plataforma. Um classificador então o identificou como potencialmente violador da Política sobre Violência Explícita da Meta. Como a conta faz parte do sistema de verificação cruzada, o post foi enviado para análise adicional. A Meta descreve a verificação cruzada como uma estratégia de prevenção de erros que fornece níveis extras de análise. Um analista humano determinou que o conteúdo não seguia a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos da Meta e removeu o post. O usuário que fez o post então procurou um contato pessoal na Meta para fazer uma apelação da remoção. Por fim, os especialistas em políticas da Meta concederam uma permissão para conteúdo de valor jornalístico, constatando que, apesar de não seguir a política, o valor de interesse público do conteúdo superava o dano. A empresa restaurou o post com um rótulo de conteúdo de valor jornalístico. Em setembro de 2024, a Meta encaminhou o caso ao Comitê.
No quarto caso, o administrador da página do Facebook de um jornal alemão postou uma imagem em maio de 2023 de uma mulher indígena com os seios descobertos segurando uma criança. A legenda e o texto sobreposto em alemão descrevem a visita de uma jornalista americana a uma aldeia maia no México, destacando suas perspectivas como mãe sobre diferentes abordagens parentais entre as culturas ocidental e indígena, e links para um artigo. A mulher indígena na imagem não parece ser maia. A imagem parece pertencer a uma agência de fotos e aparece em coleções online sobre o povo karo, da Etiópia. Um usuário denunciou esse conteúdo à Meta e dois analistas humanos concordaram que ele não seguia a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos. Como essa conta está no programa de verificação cruzada, o post foi enviado para análise adicional. A Meta então determinou que o conteúdo deveria receber uma permissão da política e permanecer no Facebook porque, embora não seguisse suas regras sobre nudez, mantê-lo estava de acordo com o fundamento da política. Quando ela encaminhou o caso sobre o povo ianomâmi ao Comitê, ela também encaminhou esse caso.
O Comitê observa o seguinte contexto ao tomar uma decisão:
De acordo com especialistas consultados pelo Comitê, entre o povo indígena himba, que vive no norte da Namíbia, as mulheres podem andar com os seios descobertos e usar joias e adornos corporais simbólicos. Essa nudez não é inapropriada nem inerentemente sexual, mas sim parte integrante de sua identidade cultural. A nudez está ligada à espiritualidade, e a pintura corporal e os adornos significam uma conexão com seu mundo ancestral e cósmico.
O povo indígena ianomâmi vive em relativo isolamento na floresta amazônica do Brasil e da Venezuela. Os homens geralmente vestem um pequeno pedaço de pano em volta da cintura, enquanto as mulheres podem usar um simples cinto de pano. Especialistas consultados pelo Comitê observaram que os ianomâmis não veem a nudez como algo inerentemente sexual. Ela está ligada à sua relação com a natureza e o cosmos e desempenha um papel importante nos rituais.
Os povos indígenas maias não têm uma tradição de nudez com significado cultural ou espiritual.
2. Envios de usuários
Os usuários que postaram o conteúdo das duas mulheres himbas e do povo himba dançando apelaram das decisões de remoção da Meta ao Comitê. Em seus envios, eles afirmam que seu conteúdo era significativo, pois apresentava os trajes tradicionais e as práticas culturais do povo himba, com o objetivo de promover a conscientização cultural e a educação. Uma apelação enfatizou que as políticas da Meta visam impedir material explícito, argumentando que a proibição da política não deve incluir representações culturais e tradições indígenas. Eles afirmaram que “reintegrar esse conteúdo é crucial para promover a compreensão e o respeito pelas culturas indígenas”.
Após os encaminhamentos do terceiro e quarto casos pela Meta, e a decisão do Comitê de aceitá-los, ambos os usuários que postaram o conteúdo tiveram a oportunidade de enviar uma declaração. Nenhuma resposta foi recebida.
3. Políticas de conteúdo e envios da Meta
I. Políticas de conteúdo da Meta
Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos
O fundamento da política da Meta afirma que a empresa geralmente restringe a nudez para proteger usuários que são sensíveis a ela, principalmente devido à origem cultural ou idade. Ela remove por padrão imagens sexuais para “impedir o compartilhamento de conteúdo de menores ou não consentido”. O fundamento também afirma que “a nudez pode ser compartilhada por vários motivos, inclusive como forma de protesto, para aumentar a conscientização sobre uma causa ou por motivos educacionais ou médicos. Quando apropriado, e essa intenção for clara, abriremos exceções para o conteúdo.”
Na época em que esses casos foram selecionados, as regras da Meta proibiam imagens de “mamilos femininos descobertos”. Em 14 de maio de 2025, a Meta atualizou essa política para se referir a “mamilos femininos visíveis” e introduziu novas restrições para usuários menores de 18 anos. Nas regras atuais, a Meta proíbe: “Imagens fotorrealistas/digitais de nudez de adultos”, incluindo “mamilos femininos visíveis, exceto em contexto de amamentação ou ato de protesto”. Há outras exceções em que a Meta rotula o conteúdo ou permite que somente usuários com 18 anos ou mais o visualizem. Em caso de “[m]amilos femininos visíveis, quando compartilhados em um contexto médico ou de saúde (incluindo mastectomia ou tatuagens de sobreviventes de câncer)”, a empresa aplica um rótulo informando que o conteúdo pode ser sensível. No caso desse tipo de nudez em “arte do mundo real” ou “compartilhada no contexto de fome, genocídio, crimes de guerra ou crimes contra a humanidade”, a Meta aplica esse rótulo e limita a visibilidade a usuários com 18 anos ou mais.
Na política antes e depois das mudanças de 14 de maio de 2025, não há exceção para mulheres indígenas com seios descobertos na linguagem pública da política, mas a empresa às vezes permite esse conteúdo por meio de exceções para conteúdo com valor jornalístico e da política. A Meta não decide essas exceções em escala, mas apenas em escalation. Isso significa que só é aplicado pelas equipes de políticas da empresa após uma análise especial (ver decisão do caso Vídeo de maquiagem para casamento infantil no Irã).
Permissão para conteúdo de valor jornalístico
Em determinadas circunstâncias, a empresa permitirá que conteúdo que não segue suas políticas permaneça na plataforma se tiver “valor jornalístico e se mantê-lo visível for de interesse público”. Ao tomar essa decisão, a Meta realiza um teste de equilíbrio que pondera o interesse público no conteúdo em relação ao risco de dano. A empresa avalia “se esse conteúdo expõe uma ameaça iminente à saúde ou segurança pública ou dá voz a perspectivas que estão sendo debatidas atualmente como parte de um processo político”. A Meta pode aplicar um aviso ao conteúdo conforme essa permissão e limitar a visualização do conteúdo por usuários menores de 18 anos. Por fim, ela afirma: “As permissões para conteúdo de valor jornalístico podem ser ‘específicas, quando se aplicam a um único trecho de conteúdo, ou ‘escalonadas’, que podem se aplicar a algo de maneira mais abrangente, como uma frase”.
Permissão da política
De acordo com a Meta, ela pode aplicar uma permissão da política ao conteúdo quando o fundamento da política e os valores da Meta exigem um resultado diferente de uma interpretação rígida das regras. Em decisões anteriores, o Comitê recomendou que a Meta fornecesse uma explicação pública sobre essa permissão (decisão do caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, reiterado nas decisões dos casos Violência comunitária no estado indiano de Odisha e Vídeo de maquiagem para casamento infantil no Irã). A Meta declarou que está em processo de implementação dessa recomendação.
Ela mantém diretrizes internas sobre quando emitir exceções da política e permitir determinados posts conforme a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos. Em relação à nudez indígena, essas diretrizes incluem sinais ou indicadores de nudez no contexto cultural, com foco nas “crenças costumeiras, normas sociais e características materiais de um grupo racial, religioso ou social e onde essa nudez é socialmente aceitável”. Para tomar essa decisão, a Meta “recorre ao contexto de mercado de [suas] equipes regionais” e no alinhamento das visões das equipes internas “para confirmar que essa nudez é de fato socialmente aceitável e que não há preocupações de segurança para as pessoas retratadas na imagem”.
II. Envios da Meta
A Meta determinou que todos os quatro posts não seguiam sua Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, que proíbe “mamilos femininos [visíveis]”. Apesar disso, a empresa considerou que o conteúdo compartilhado nos casos dos posts sobre os povos ianomâmis e maia/karo era elegível para uma permissão para conteúdo de valor jornalístico e uma permissão de política, respectivamente. Por fim, permitiu esses posts.
Os posts das duas mulheres himbas e do povo himba dançando foram removidos. Segundo a empresa, havia um risco maior de o conteúdo ser sexualizado e não estava claro se as pessoas retratadas consentiriam que suas imagens fossem compartilhadas. No momento da remoção, nenhum trecho de conteúdo foi encaminhado a especialistas internos para análise posterior.
Em ambos os casos, a Meta determinou que uma exceção de política não era apropriada, pois não havia nenhuma indicação de que as mulheres himbas retratadas tivessem consentido que suas imagens fossem compartilhadas. A Meta também concluiu que a permissão para conteúdo de valor jornalístico não era justificada, pois o valor de interesse público do conteúdo não superava o risco de dano. De acordo com a empresa, indivíduos que não eram membros da comunidade himba compartilharam os posts. Ela constatou que elas foram postadas principalmente para fins pessoais, em vez de conscientizar ou dar voz às perspectivas debatidas em torno do povo himba. A Meta determinou que, nesses casos, os riscos à privacidade e à dignidade superavam o valor da voz.
No caso do post sobre o povo ianomâmi, a Meta concedeu uma permissão para conteúdo de valor jornalístico “restrito”, aplicável apenas ao post em questão. Ela determinou que o valor de interesse público do conteúdo superava o risco potencial de contribuir para danos no meio físico. A filmagem foi compartilhada pela conta oficial do Instagram de um partido político brasileiro, abordando uma questão política atual relacionada ao povo ianomâmi. Os principais fatores na avaliação da Meta incluíram a legenda e o texto de sobreposição do post, que visavam conscientizar sobre os direitos do povo ianomâmi e a mineração ilegal. A Meta também considerou que a nudez retratada no conteúdo parecia incidental e secundária à mensagem mais ampla de conscientização. A empresa não emitiu uma proposta de permissão de política de acordo com suas diretrizes internas de exceção porque não encontrou nenhuma indicação de que os ianomâmis retratados na imagem provavelmente consentiriam que suas fotos fossem compartilhadas.
A Meta concedeu uma permissão de política ao conteúdo sobre os povos maia/karo. A empresa determinou que, como o conteúdo foi postado por um meio de comunicação, era provável que a foto tivesse sido tirada com o consentimento da pessoa retratada e com o entendimento de que seria distribuída. Os especialistas da empresa no assunto também confirmaram que a nudez na imagem estava “associada a crenças costumeiras, normas sociais e características materiais de um grupo indígena onde a nudez é socialmente aceitável”. Nesse post, um jornal diário alemão discute a experiência de um jornalista visitando um vilarejo maia. Entretanto, em resposta a uma pergunta do Comitê, a Meta reconheceu que a imagem não parece retratar o povo maia e que a nudez não é um elemento da cultura maia.
O Comitê fez perguntas à Meta sobre sua política sobre nudez, iniciativas para modificar a política ao longo do tempo, as partes interessadas consultadas sobre isso e os processos de aplicação. O Comitê também perguntou como a Meta avalia ou infere consentimento ao conceder permissões. A Meta respondeu a todas as perguntas.
4. Comentários públicos
O Comitê recebeu três comentários públicos que cumpriam os termos para envio. Um dos comentários enviados era dos Estados Unidos e do Canadá, um da América Latina e do Caribe e um da África Subsaariana. Para ler comentários públicos enviados com consentimento de publicação, clique aqui.
Os envios abordaram os seguintes temas: grupos indígenas que praticam nudez ou nudez parcial como forma de expressão cultural; as tradições do povo ianomâmi e a importância de proteger sua liberdade de expressão nas redes sociais; e considerações sobre políticas de moderação de conteúdo para equilibrar a expressão cultural com a autonomia individual.
5. Análise do Comitê de Supervisão
O Comitê selecionou esses casos para avaliar o impacto das regras de nudez da Meta na capacidade de compartilhar representações de nudez cultural indígena e o impacto dessas regras sobre os povos indígenas, especialmente as mulheres que tradicionalmente andam com os seios descobertos. Esses casos destacam a tensão entre os valores de voz da Meta e a garantia da privacidade e dignidade dos povos indígenas. Eles se enquadram na nossa prioridade estratégica de gênero.
O Comitê já havia abordado anteriormente as regras da Meta sobre “mamilos femininos descobertos” e agora “visíveis” (decisões sobre os casos Sintomas de câncer de mama e nudez e Identidade de gênero e nudez). Nesses casos, o conteúdo se enquadrava nas exceções de políticas existentes. Esses casos oferecem ao Comitê a oportunidade de avaliar conteúdo com mulheres indígenas de seios descobertos, retratadas em um contexto cultural não sexual, o que não é coberto por nenhuma exceção de política pública.
O Comitê analisou a decisão da Meta nesse caso em relação às políticas de conteúdo, aos valores e às responsabilidades de direitos humanos da Meta. Ele também avaliou as implicações desse caso quanto à abordagem mais ampla da Meta em relação à governança de conteúdo.
5.1 Conformidade com as políticas de conteúdo da Meta
Regras de conteúdo
Todos os quatro posts não seguem os termos expressos da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, que proíbe imagens de “mamilos femininos visíveis”. Todos eles retratam mulheres indígenas com os seios descobertos e não se enquadram nas exceções da política, que são “amamentação ou ato de protesto”, “contextos médicos ou de saúde” e representações relacionadas a “fome, genocídio, crimes de guerra ou crimes contra a humanidade”.
O Comitê analisa, portanto, as decisões da Meta sobre a concessão ou não de permissões nesses casos.
No caso do povo ianomâmi, o Comitê considera que a Meta estava certa em manter esse post no Instagram como conteúdo de valor jornalístico devido ao seu alto valor de interesse público e risco limitado de danos. O post abordou questões atuais de direitos humanos e políticas decorrentes da crise humanitária enfrentada pelos ianomâmis devido à mineração ilegal em suas terras, uma questão ecoada em um comentário público (ver PC-30909, Internet Lab). Por outro lado, o risco também é limitado, pois os ianomâmis têm uma prática social e cultural de nudez com o os seios e o peito descobertos e, nessa imagem específica, as mulheres olham para a câmera e parecem estar cientes de que estão sendo fotografadas.
Entretanto, o Comitê discorda de como a Meta aplicou sua permissão de política nos três casos restantes.
Em relação aos casos das duas mulheres himbas e do povo himba dançando, o Comitê considera que a falha da Meta em conceder uma parte da permissão da política foi errada. A decisão da Meta foi baseada no fato de os posts serem compartilhados por pessoas físicas, sem nenhuma indicação de consentimento das mulheres himbas e sem a intenção de conscientizar ou abordar uma questão de interesse público. Embora essas sejam considerações razoáveis, o Comitê observa que a Meta não seguiu suas próprias diretrizes de exceção referentes ao consentimento implícito em relação à nudez indígena.
A nudez é um elemento social e historicamente aceito dos costumes himbas. Além disso, os himbas têm vivenciado um interessecrescente de pesquisadores, jornalistas e turistas e demonstrado aparente abertura aos visitantes que compartilham seu modo de vida. Nesses posts específicos, há indicadores de consentimento. No caso das duas mulheres himbas, elas são retratadas de forma aproximada, olhando diretamente para a câmera. Os analistas da Meta em escalation também devem considerar contexto adicional do post. A imagem alvo da apelação foi acompanhada por outras fotos das mulheres himbas junto com o autor do post, o que sugere ainda mais consentimento. A imagem no post do povo himba dançando parece ter sido tirada de perto durante uma apresentação pública, sugerindo que o homem dançando e as mulheres himbas ao fundo provavelmente sabiam que estavam sendo gravados.
O Comitê considera que, de acordo com as próprias diretrizes internas da Meta sobre quando aplicar a permissão de política, esses sinais são suficientes para conceder a permissão. Ele reconhece que o consentimento para que imagens sejam tiradas nem sempre equivale ao consentimento para que imagens sejam distribuídas. No entanto, a abordagem do povo himba à nudez, juntamente com os indicadores específicos de conteúdo, torna a aplicação da exceção consistente com a intenção da política de impedir o compartilhamento de imagens não consensuais que afetam a privacidade e a dignidade. No entanto, o Comitê reitera abaixo suas preocupações com a permissão de política da Meta.
Em relação ao caso dos posts sobre os povos maia/karo, a maioria do Comitê considera que a Meta não deveria ter concedido uma permissão de política para manter esse conteúdo no Facebook de acordo com suas próprias regras. Embora a Meta tenha se concentrado no fato de a imagem ter sido compartilhada por um meio de comunicação, o que, segundo ela, sugere, de modo geral, que a mulher consentiu e entendeu que sua imagem seria distribuída, isso não deve ser um fator determinante. Nesse caso, há uma clara disparidade entre o assunto do artigo (povo maia) e o indivíduo na imagem (uma mulher karo). O Comitê conclui que um meio de comunicação provavelmente saberia que não se tratava de uma mulher maia, mas selecionou uma imagem nua não relacionada de uma mulher karo.
Os próprios critérios internos da Meta para permitir a nudez cultural, quando ela está “associada às crenças costumeiras, normas sociais e características materiais de um […] grupo, e onde essa nudez é socialmente aceitável”, não são atendidos nesse caso. O conteúdo, focado nas práticas parentais nas culturas maias, não se relaciona com uma tradição social ou histórica de nudez. Esse caso levanta novamente questões sobre se o consentimento para ser fotografado equivale ao consentimento implícito para distribuição. Essa preocupação é ainda maior em um contexto de isca de cliques, em que títulos ou imagens exagerados ou enganosos são usados para gerar engajamento com os posts. Portanto, permitir que o conteúdo permaneça na plataforma é inconsistente com o fundamento da política da Meta.
Uma minoria do Comitê discorda, considerando que a Meta tomou a decisão certa ao manter o post em uma discussão sobre um assunto de interesse público. Dada a política atual, isso deve ser considerado conteúdo de valor jornalístico. Para a minoria, o fator mais importante é que a nudez na imagem esteja alinhada às normas culturais do grupo indígena retratado. Na opinião deles, a substituição de uma mulher karo por uma mulher maia foi um erro menor cometido por terceiros e não diminuiu o interesse público no post.
5.2 Conformidade com as responsabilidades da Meta relativas aos direitos humanos
Liberdade de expressão (Artigo 19 do PIDCP)
Em 16 de março de 2021, a Meta anunciou sua Política Corporativa de Direitos Humanos, na qual descreve seu compromisso em respeitar os direitos de acordo com os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos (UNGPs). De acordo com os UNGPs, as empresas devem “evitar infringir os direitos humanos de terceiros e devem abordar o impacto adverso nos direitos humanos com os quais estão envolvidas” (Princípio 11, UNGPs).
O artigo 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP) oferece ampla proteção à liberdade de expressão. O direito à liberdade de expressão é garantido a todas as pessoas, sem discriminação de “sexo” ou “outro status” (PIDCP, Artigo 2, parágrafo 1). O Relator Especial das Nações Unidas (ONU) sobre o direito à liberdade de expressão enfatiza “a importância que o exercício do direito à liberdade de opinião e expressão tem para as minorias e os povos indígenas, pois [é] uma ferramenta básica para garantir o reconhecimento específico dos direitos exigidos por esses grupos” (A/HRC/14/23 parágrafos 41 e 59).
O Artigo 19 também protege o direito de buscar e receber informações. Nesses casos, a importância da expressão é reforçada porque o conteúdo compartilha informações relevantes aos direitos culturais. O Relator Especial da ONU sobre o direito à liberdade de expressão declarou que a expressão serve como um “facilitador” de outros direitos, incluindo [...] o direito de participar na vida cultural [...] bem como os direitos civis e políticos” (A/HRC/17/27, parágrafo 22, ver também Comentário Geral n.º 21, E/C.12/GC/21, parágrafos 13-19, 37). De acordo com o Comitê das Nações Unidas para os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (CDESC), o direito de participar na vida cultural inclui o direito “de procurar e desenvolver conhecimentos e expressões culturais e de os compartilhar com outros” ( Comentário Geral n.º 21, E/C.12/GC/21, parágrafo 15). Isto estende-se à compreensão da “própria cultura e da dos outros por meio da educação e da informação”, e à aprendizagem “sobre formas de expressão e disseminação por meio de qualquer meio técnico de informação ou comunicação” ( Comentário Geral n.º 21, E/C.12/GC/21, parágrafo 15).
Além disso, os mecanismos da ONU reconheceram repetidamente que a vida cultural inclui tradições, costumes e vestimentas (Relator Especial sobre direitos culturais, A/HRC/17/38 e Corr.1, parágrafo 4; CDESC, Comentário Geral n.º 21, E/C.12/GC/21, parágrafo 13; Mecanismo de Peritos sobre os Direitos dos Povos Indígenas A/HRC/30/53, parágrafos 5 e 7). Da mesma forma, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas reconhece os direitos dos Povos Indígenas especificamente às suas práticas culturais (artigos 11–13, 15 e 31).
Nesse sentido, a análise do Comitê é embasada por fortes proteções à expressão como facilitadora de direitos, incluindo direitos culturais, bem como direitos civis e políticos. Quando um Estado aplica restrições à expressão, elas devem atender aos requisitos de legalidade, objetivo legítimo e necessidade e proporcionalidade (Artigo 19, parágrafo 3 do PIDCP). Esses requisitos costumam ser chamados de “teste tripartite”. O Comitê usa essa estrutura para interpretar as responsabilidades de direitos humanos da Meta, tanto em relação a posts específicos quanto à abordagem da Meta em relação à governança de conteúdo.
Dado que a Meta decidiu que o post sobre o povo ianomâmi deveria permanecer em sua plataforma, o conteúdo não foi removido e, portanto, não houve violação de expressão em relação a esse conteúdo específico. Como resultado, o Comitê não analisará mais o caso e manterá a decisão da Meta nesse caso.
Como a Meta removeu os posts sobre o povo himba, e o Comitê concluiu que, de acordo com suas próprias regras, o post sobre os povos maia/karo deveria ser removido, ele avalia esses posts de acordo com a estrutura de teste tripartite.
I. Legalidade (clareza e acessibilidade das regras)
O princípio da legalidade exige que as regras que limitam a expressão sejam acessíveis e claras (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 25). As pessoas que usam as plataformas da Meta devem ser capazes de acessar e entender as regras, e os analistas de conteúdo devem ter orientações claras sobre sua aplicação.
A Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos da Meta proíbe: “mamilos femininos visíveis”, exceto em contextos específicos, como “amamentação ou ato de protesto” ou “quando compartilhados em um contexto médico ou de saúde (incluindo mastectomia ou tatuagens de sobreviventes de câncer)”. O Comitê considera que as regras específicas que proíbem “mamilos femininos visíveis” são suficientemente claras quando aplicadas aos fatos desses casos.
No entanto, o Comitê reitera suas preocupações quanto à aplicação de permissões pela Meta. Em relação a conteúdo de valor jornalístico, o Comitê observa que a Meta forneceu maior clareza sobre o processo e os critérios para essa permissão em sua Central de Transparência em resposta às recomendações do Comitê (consulte as decisões sobre os casos Suspensão do ex-presidente Trump, Protestos na Colômbia e Slogan de protesto no Irã).
No que diz respeito à permissão de política, o Comitê observou repetidamente que essa permissão pode “ficar aquém do padrão de legalidade” (ver decisões sobre os casos Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, Violência comunitária no estado indiano de Odisha e Vídeo de maquiagem para casamento infantil no Irã). Na decisão do caso Produtos farmacêuticos do Sri Lanka, o Comitê reconheceu a necessidade de uma permissão geral para evitar injustiças claras ao moderar grandes quantidades de conteúdo em escala global. No entanto, recomendou que a Meta descrevesse os critérios usados para aplicar esta permissão, o que a empresa se comprometeu a fazer, e a usá-la apenas em circunstâncias excepcionais.
Essas permissões especiais têm limitações significativas. Em termos de previsibilidade, as regras da Meta para permitir esse tipo de conteúdo são descritas em diretrizes internas confidenciais, que não estão disponíveis publicamente. Isso não fornece informações suficientes sobre que tipo de conteúdo é permitido. Em termos de acessibilidade, a Meta tem vias limitadas para identificar conteúdo que deve se qualificar para essas permissões porque os moderadores em escala da Meta não podem aplicá-las e não são instruídos ou autorizados a identificar e escalar conteúdo que poderia se beneficiar delas (consulte a decisão do caso Candidato a prefeito assassinado no México). Aqui, por exemplo, apenas o conteúdo postado por contas verificadas permaneceu na plataforma. Contas que não fazem parte do programa de verificação cruzada da Meta ou não têm contatos na empresa enfrentam desafios significativos para obter acesso a equipes especializadas que podem aplicar essas permissões. Em sua resposta ao Comitê para esse caso, a Meta reconheceu que a concessão dessas permissões em escalation pode levar a desigualdades na aplicação.
Quando as permissões são usadas repetidamente da mesma maneira, a empresa deve avaliar cuidadosamente se isso deve ser incluído explicitamente na política. De acordo com a Meta, a nudez cultural é um problema significativo que é recorrentemente abordado em suas plataformas.
Para garantir que a Meta aplique suas exceções com base em critérios claros, o Comitê recomenda que ela desenvolva indicadores de nudez cultural indígena, conforme discutido abaixo. Também deve incluir uma exceção limitada dentro da Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos pública para permitir conteúdo que retrate mulheres indígenas com seios descobertos em contextos culturais não sexuais.
II.Objetivo legítimo
Qualquer restrição à liberdade de expressão deve perseguir um ou mais dos objetivos legítimos listados no PIDCP, o que inclui a proteção dos direitos de outras pessoas. Conforme constatado anteriormente na decisão do caso Identidade de gênero e nudez, a Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos da Meta busca perseguir o objetivo legítimo de proteger os direitos de terceiros, entre outros objetivos. Ao buscar “prevenir o compartilhamento de conteúdo não consensual”, a política atende ao objetivo legítimo de proteger o direito à privacidade de terceiros (PIDCP, Artigo 17), particularmente de mulheres indígenas nesse caso.
Em seu fundamento ao Comitê nesse caso, a Meta também citou o objetivo de proteger “a sensibilidade dos usuários”. Anteriormente, no caso Identidade de gênero e nudez, Meta fez referência à “sensibilidade da comunidade”. Lá, o Comitê observou que isso poderia estar alinhado com o objetivo de preservar a “moral pública”, mas expressou preocupação de que esse conceito tenha sido mal utilizado por governos para violar os direitos de membros de grupos vulneráveis. O Comitê de Direitos Humanos alertou que “o conceito de moral deriva de muitas tradições sociais, filosóficas e religiosas; consequentemente, as limitações (...) com o objetivo de proteger a moral devem ser baseadas em princípios que não derivam exclusivamente de uma única tradição” (Comitê de Direitos Humanos, Comentário Geral 34, parágrafo 32). Como resultado, o Comitê novamente dá maior ênfase à proteção do direito à privacidade.
Uma minoria do Comitê acredita que a “sensibilidade da comunidade” não pode ser considerada uma justificativa legítima para limitações de expressão, a menos que seja claramente destinada a preservar a moral pública, o que não foi demonstrado nesse caso. A Meta não deve estender os motivos enumerados para restringir a expressão. Além disso, a liberdade de expressão inclui expressões desagradáveis ou ofensivas.
III.Necessidade e proporcionalidade
Nos termos do artigo 19(3) do PIDCP, a necessidade e a proporcionalidade exigem que as restrições à expressão “devem ser adequadas para atingir sua função de proteção; devem ser o instrumento menos intrusivo entre aqueles que podem atingir sua função de proteção; devem ser proporcionais ao interesse a ser protegido” (Comentário Geral n.º 34, parágrafo 34).
Primeiro, o Comitê analisará os testes de necessidade e proporcionalidade aplicados aos casos dos posts sobre os povos himba e maia/karo. Em seguida, será realizada uma análise mais ampla da política da Meta que proíbe conteúdo que mostre mulheres indígenas com os seios descobertos, em que a nudez faz parte de sua expressão cultural.
O Comitê considera que a decisão da Meta de remover os posts nos casos das duas mulheres himbas e do povo himba dançando não foi necessária nem proporcional. Considerando a natureza das imagens e os indicadores de consentimento, e a abordagem do povo himba à nudez, restringir a expressão para proteger a privacidade dos retratados não era necessário. A nudez retratada é um aspecto culturalmente aceito e historicamente enraizado na herança das mulheres himbas. Os posts incluem vários indicadores de consentimento implícito, como envolvimento direto com a câmera, interação com o suposto fotógrafo e o cenário de uma apresentação pública, sugerindo que as mulheres provavelmente sabiam que estavam sendo gravadas. Além disso, nenhum dos posts retrata as mulheres himbas de maneira distorcida, descontextualizada, pejorativa ou exploradora. Portanto, remover o conteúdo representa um fardo desproporcional para o autor do post e para o público, que estava compartilhando e buscando informações sobre as tradições do povo himba.
No caso do post sobre os povos maia/karo, a maioria do Comitê considera que, em conformidade com a aplicação correta das regras atuais da Meta, a remoção do conteúdo foi necessária e proporcional para proteger o direito da mulher indígena à privacidade. Independentemente de a mulher karo ter consentido em ter sua foto tirada, essa representação, postada por terceiros, deturpa sua prática cultural. A foto mostra uma mulher indígena karo da Etiópia, uma comunidade onde a nudez é culturalmente aceita, enquanto o artigo discute práticas parentais entre o povo maia, cujas normas culturais não incluem nudez. O artigo não faz referência às mulheres karo. Esse desalinhamento afeta a privacidade e a dignidade da mulher retratada ao retratar imprecisamente sua cultura. Diante disso, a remoção é a resposta necessária e proporcional, em conformidade com as responsabilidades de direitos humanos da Meta.
Uma minoria discorda, argumentando que a nudez está enraizada na cultura karo, o que cria uma presunção de consentimento. Isso é especialmente verdadeiro porque a comunidade permitiu que suas fotos fossem tiradas em muitas outras situações. Não há nenhuma indicação de que a mulher karo não tenha consentido implicitamente em ser retratada com os seios descobertos e, portanto, seus direitos não foram afetados. Na opinião da minoria, atribuir motivos inapropriados não pode servir de base para restringir a expressão sem provas. Nesse caso, o jornal se baseou de boa-fé em uma imagem pertencente a uma agência de fotos. Como não há nenhuma pessoa maia retratada, não pode haver problemas de privacidade para o povo maia.
O Comitê também conclui que a proibição total da Meta de postar imagens de mulheres indígenas com os seios descobertos e a concessão de exceções ad hoc quando o conteúdo chega a equipes especiais da Meta não resulta em restrições necessárias e proporcionais à expressão. Embora algumas representações de nudez indígena possam afetar os direitos à privacidade, como mostra o caso do post sobre os povos maia/karo, uma proibição total limita desproporcionalmente a expressão.
O Comitê já havia observado anteriormente o “grave impacto desta política nas comunidades onde as mulheres podem tradicionalmente andar com os seios descobertos”. Uma proibição total restringe sua capacidade de usar as redes sociais para autoexpressão e autorrepresentação em geral, perpetuando a exclusão em espaços digitais. Sejam essas imagens postadas pelas próprias mulheres ou por outras pessoas, todas as representações da vida cotidiana, bem como imagens de mulheres indígenas com os seios descobertos exercendo direitos civis e políticos, seriam removidas.
Também afeta desproporcionalmente o direito dos povos indígenas de compartilhar informações específicas sobre suas práticas culturais, incluindo trajes tradicionais, ao mesmo tempo em que restringe o acesso de outros a essas informações. As plataformas digitais oferecem um espaço vital para as pessoas preservarem tradições e educarem outras pessoas sobre as suas culturas (A/74/255, parágrafos 6, 70 e 83). Especialistas consultados pelo Comitê declararam que algumas mulheres indígenas usam essas imagens nas redes sociais para compartilhar suas histórias com precisão, em seus próprios termos, e para transmitir tradições culturais.
Uma abordagem diferente respeitaria melhor a expressão dos usuários e, ao mesmo tempo, protegeria os direitos das mulheres indígenas à privacidade. O Comitê recomenda que a Meta torne pública sua exceção interna em sua Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos para permitir imagens de mulheres indígenas com os seios descobertos em algumas circunstâncias. Uma exceção pública, em vez de permissões, remove o ônus da expressão de que mulheres indígenas de seios descobertos devem ter “conteúdo de valor jornalístico” ou servir a propósitos de “conscientização” ou “educacionais” para permanecerem ou serem retratadas online.
O Relator Especial da ONU sobre o direito à liberdade de expressão solicitou que as empresas colaborem com grupos indígenas em todo o mundo para “desenvolver melhores indicadores a fim de considerar o contexto cultural e artístico ao avaliar conteúdo com nudez” (A/HRC/38/35, parágrafo 54).
Em relação ao consentimento, o Comitê reconhece que concordar em ser fotografado ou gravado nem sempre implica consentimento para a distribuição dessas imagens. No entanto, as perspectivas de muitos povos indígenas sobre a nudez e o compartilhamento dessas imagens diferem das visões sobre nudez e consentimento que as regras da Meta refletem. Essa distinção é implicitamente refletida nas atuais diretrizes internas de permissão da Meta, que levam essas diferenças culturais em consideração ao avaliar esse conteúdo. As diretrizes internas da Meta se concentram na possibilidade da nudez com os seios descobertos fazerem parte das crenças e dos costumes de um povo indígena e ser socialmente aceita. O Comitê entende que, em alguns contextos culturais indígenas, como os desses casos, a nudez não é entendida como algo inerentemente sexual, mas sim como parte integrante da identidade cultural. Em conformidade com as diretrizes internas da Meta, o Comitê acredita que a empresa deve considerar isso como consentimento implícito quando for determinado que o conteúdo reflete esses costumes e crenças, principalmente quando for determinado que o conteúdo foi compartilhado pelos próprios povos indígenas.
No entanto, além disso, o Comitê observa que instrumentos internacionais e especialistas em direitos humanos da ONU enfatizaram a importância de representações de culturas indígenas que evitem distorções ou descontextualizações.
Por exemplo, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas afirma o direito dos povos indígenas à “dignidade e à diversidade de suas culturas, tradições, histórias e aspirações, que devem ser adequadamente refletidas na educação e na informação pública (Artigo 15, ver também Artigo 31, Comentário Geral n.º 21, E/C.12/GC/21, parágrafo 37). Da mesma forma, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) enfatiza que os esforços para aumentar a conscientização sobre as culturas indígenas devem evitar “descontextualizar ou desnaturalizar as manifestações ou expressões do patrimônio cultural imaterial”. A UNESCO destaca a importância do “respeito mútuo” e da “apreciação do patrimônio cultural imaterial” (ver a Convenção da UNESCO para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, as suas Diretivas Operacionais, parágrafo 102.a) e Princípios Éticos, 3 e 10). O Comitê considera que “descontextualização ou desnaturalização” se refere ao compartilhamento de conteúdo fora de seu contexto original, o que o retira de seu significado pretendido ou importância cultural e aumenta o risco de deturpação ou distorção. Exemplos de descontextualização incluem, mas não estão limitados a, conteúdo que retrata nudez cultural de forma sexualizada, discriminatória ou com isca de cliques. Na exceção à sua Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, além dos fatores atuais que a Meta utiliza, a empresa também deve incorporar este fator de evitar a descontextualização da prática indígena, principalmente quando as representações são compartilhadas por terceiros.
O Comitê reconhece que determinar quando permitir conteúdo de nudez indígena com base nesses fatores exigirá análise contextual. Isso o torna desafiador para análise em escala e mais adequado para escalation. Embora o Comitê tenha expressado preocupação sobre a eficácia das políticas de apenas escalation (ver decisões sobre os casos Vídeo de prisioneiro das Forças de Apoio Rápido do Sudão e Declarações sobre o primeiro-ministro do Japão), ele reitera que uma exceção claramente definida é preferível a recorrer a permissões.
A Meta enfatizou ao Comitê as dificuldades em implementar quaisquer novas exceções à sua política sobre nudez com sua atual tecnologia de monitoramento. O Comitê reconhece os desafios que a Meta pode enfrentar na implementação de critérios para identificar a nudez indígena. No entanto, os Padrões da Comunidade já incluem uma lista de exceções que exigem que a empresa diferencie entre diferentes tipos de nudez, como imagens que retratam “atos de protesto”. Portanto, apesar dos desafios na implementação dessas políticas, o Comitê considera que a expressão cultural indígena deve receber a mesma consideração.
O Comitê considera que a Meta poderia estabelecer vias claras e desenvolver diretrizes internas para auxiliar analistas em larga escala a escalar conteúdo de nudez indígena com os seios descobertos que poderia potencialmente se beneficiar dessas exceções, usando critérios objetivos. Esses sinais podem incluir indicadores como hashtags relevantes ou marcação geográfica. Além disso, indicações visuais, como pintura corporal, joias, penas, símbolos culturais ou objetos cerimoniais, podem ajudar a esclarecer que uma imagem pode incluir nudez indígena.
A Meta também poderia adotar outras medidas para mitigar potenciais danos causados por representações de nudez indígena, incluindo danos à liberdade de expressão das próprias comunidades. Por exemplo, ela poderia implementar vias de apelação culturalmente apropriadas que permitissem aos povos indígenas e seus membros solicitar a restauração de conteúdo que retrate mulheres indígenas com seios descobertos que tenha sido removido de forma inadequada, ou a remoção de conteúdo compartilhado sem consentimento ou que deturpe sua cultura. Além disso, a Meta poderia capacitar essas comunidades a sinalizar conteúdo que elas acreditam ter sido removido indevidamente ou que retrata suas tradições de maneira imprecisa por meio do programa Parceiros Confiáveis da Meta.
O Comitê também observa que a Meta deve considerar aplicar a abordagem recomendada por ele a outros casos de nudez cultural. Por exemplo, na representação pública de algumas cerimônias, festividades e eventos tradicionais, como a Dança do Junco em Eswatini, algumas mulheres ficam com os seios descobertos. As regras atuais da Meta também proíbem o compartilhamento de informações sobre aspectos importantes desses grupos e comunidades culturais.
6. A decisão do Comitê de Supervisão
O Comitê de Supervisão anula a decisão da Meta de remover os posts sobre as duas mulheres himbas e do povo himba dançando, exigindo que eles sejam restaurados. Ele também anula a decisão da Meta de deixar ativo o caso do post sobre os povos maia/karo, exigindo que ele seja removido. O Comitê mantém a decisão da Meta de deixar ativo o post sobre os ianomâmis.
7. Recomendações
Política de conteúdo
1. Para melhor proteger a expressão, respeitando os direitos dos povos indígenas e dos seus membros, a Meta deve tornar pública sua exceção na Política sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos, permitindo conteúdo que retrate mulheres indígenas com os seios descobertos em algumas circunstâncias. Essa exceção deve ser aplicada somente em escalation, e deve permitir esse tipo de nudez quando ela refletir costumes e crenças socialmente aceitos e não deturpar essas práticas.
O Comitê considerará essa recomendação implementada quando a Meta atualizar os Padrões da Comunidade sobre Nudez e Atividade Sexual de Adultos voltados ao público com a exceção da política.
*Nota processual:
- As decisões do Comitê de Supervisão são tomadas por painéis de cinco membros e aprovadas por maioria de votos do Comitê inteiro. As decisões dele não representam, necessariamente, as opiniões de todos os membros.
- De acordo com seu Estatuto, o Comitê de Supervisão pode analisar apelações de usuários cujo conteúdo foi removido pela Meta, apelações de usuários que denunciaram conteúdo que a Meta manteve ativo e decisões que a Meta encaminha a ele (Seção 1 do Artigo 2 do Estatuto). O Comitê tem autoridade vinculativa para manter ou anular as decisões de conteúdo da Meta (Seção 5 do Artigo 3 e 4 do Estatuto). Ele pode emitir recomendações não vinculativas às quais a Meta é obrigada a responder (Seção 4 do Artigo 3 e 4 do Estatuto). Quando a Meta se compromete a agir de acordo com as recomendações, o Comitê monitora sua implementação.
Para a decisão sobre o caso em questão, uma pesquisa independente foi encomendada em nome do Comitê. O Comitê recebeu assistência da Duco Advisors, uma empresa de consultoria especializada na intercessão entre as áreas de geopolítica, confiança e segurança, e tecnologia. A Memetica, um grupo de investigações digitais que fornece serviços de consultoria de risco e inteligência contra ameaças para mitigar danos online, também forneceu pesquisas.
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